As empresas de serviços profissionais (consultorias, empresas de auditoria, escritórios de advocacia etc.) normalmente desenvolvem suas “soluções” internamente, com base na sua visão de valor e as oferecem para uma ampla gama de clientes.
Porém, essa estratégia já não está funcionando como antes e essas empresas estão sofrendo uma ampla comoditização das ofertas dos seus respectivos mercados.
O cliente, por outro lado, é inundado por longos materiais institucionais, com imagens bonitas sobre as diversas áreas de atuação da empresa, onde ela está presente ao redor do País (e eventualmente no exterior), eventuais prêmios/rankings e por aí vai.
Agora, qual parte destes materiais está focada no cliente? Nenhuma!
A grande maioria das estratégias de desenvolvimento de negócios está focada na venda orientada aos atributos, benefícios e características da nossa organização e das nossas áreas (o que chamamos de venda “ABC”) e este tipo de abordagem está com seus dias contados.
Na realidade o cliente não compra um produto, serviço e nem uma solução; o que ele(a) quer é o resultado da transformação da utilização deste produto, serviço, solução em algo valioso para ele(a).
Nessa linha, o guru Peter Drucker dizia que o cliente raramente compra aquilo que a empresa acha que está vendendo.
E com base nesse raciocínio, o professor Clayton Christensen, influenciado por Drucker e Levitt, popularizou a teoria do Jobs to be Done ou “Trabalhos a serem Feitos”.
De acordo com essa teoria, consumidores “contratam” ou “demitem” um produto/serviço com base no trabalho que tal produto/serviço pode ajudá-los a realizar (ou não).
A solução é o meio, o impacto é o fim.
E ao refletirmos sobre os “trabalhos a serem feitos” dos nossos clientes, nossa visão de concorrência e mercado também se expande.
Por exemplo: com quem o Netflix concorre? Amazon Prime? YouTube? Certamente.
Mas a partir do momento em que entendemos que parte do “trabalho” que leva alguém a contratar o Netflix pode ser simplesmente poder relaxar ou se entreter, então o Netflix concorre com o Playstation, com um bom livro e até com um jogo de Banco Imobiliário.
Desta forma, as empresas de serviços profissionais precisam deixar a visão tradicional de “áreas de atuação” e focar na identificação e entrega de resultados – ou trabalhos – que os clientes efetivamente querem e precisam realizar dentro das suas empresas.
Em um fascinante caso, a empresa de pneus Michelin, em vez de vender pneus de caminhão às mineradoras – que é um produto comoditizado ou alguém consegue explicar em detalhes a diferença entre os produtos da Michelin e da Pirelli? -, a empresa passou a celebrar contratos de prestação de serviços de carga transportada por quilômetro com essas empresas. E para as empresas áreas, em vez de vender pneus para avião, passou a vender número de aterrissagens realizadas.
Agora pare e reflita: qual é o trabalho que os pneus estão realizando para seus clientes? Transportar carga e realizar aterrisagens, da forma mais eficiente e segura possível.
Ou seja, o cliente na realidade não quer o pneu! Se um drone resolver este trabalho de uma maneira mais eficiente, ele rapidamente trocará sua frota de caminhões.
Vale destacar que eventualmente, em alguns casos, nem os próprios clientes saberão ou conseguirão articular com clareza o “trabalho a ser feito”.
Seria o equivalente a irmos a uma médica e ela nos perguntar “como posso te ajudar” e esperar que tenhamos todas as respostas, inclusive sobre a melhor forma de tratarmos a nossa dor.
Então cabe a nós, consultores, auditores, advogadas, analisarmos quais trabalhos os clientes simplesmente não conseguem realizar ou realizam de forma precária.
Quais trabalhos eles(as) simplesmente não querem fazer e seria espetacular se alguém os fizesse por eles(as), ou eliminasse ao máximo o esforço necessário para concluí-los?
Ao refletirmos sobre as dores e necessidades dos clientes através desta lente, deixamos de liderar conversas a partir das nossas soluções/áreas de atuação e assumimos uma posição co-desenvolvimento com nossos clientes, que é um pilar fundamental em vendas consultivas.
E não se enganem: vocês estão em vendas!
Não é uma venda transacional e apelativa, mas a venda consultiva, com geração de valor real.
Porém, “valor real” com base na visão dos seus clientes, não na sua.
E chegamos à provocação final: você realmente sabe o que os seus clientes querem?